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O trigo em 2023

A 7ª edição do Encontro da Cadeia Produtiva do Trigo, realizado pelo Sindicato da Indústria do Trigo no Estado de São Paulo (Sindustrigo), aconteceu no final de 2022 e reuniu as principais lideranças do setor e representantes da panificação, indústria de moagem e alimentação, produtores, empresas de insumos e cooperativas.

Em quatro painéis, o encontro que contou com a presença dos mais diversos representantes da cadeia de trigo do país promoveu discussões e debates para promover o conhecimento sobre o cenário econômico atual, panoramas dos mercados consumidores e também contou com temáticas voltadas para a inovação e conjuntura mercadológica.


Debatemos temas de relevância para o nosso setor, além de promovermos a troca de informações e experiências entre todos os elos da cadeia, proporcionando assim um panorama do nosso mercado e auxiliando a todos nas tomadas de decisão para os próximos meses”, disse em entrevista o presidente do Sindustrigo, Amedeo di San Marzano.

Com relação ao cenário econômico, que vem trazendo muita volatilidade às commodities, o setor contou com a palestra de Mário Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco. Ele atualizou o setor no contexto internacional, assim como os impactos que os mercados chinês, americano e europeu estão sofrendo ainda sob efeito da Covid-19, mas principalmente com o conflito entre Rússia e Ucrânia.

A guerra e o pós Covid-19 acabaram resultando em um cenário de inflação global, com a americana decolando. “Em setembro, ela surpreendeu e os juros subiram 5,5%, um percentual raro na história da economia americana”, comentou o economista. 

Mesquita explicou também que no ambiente atual de alta dos juros, com o dólar estendendo o ciclo de força e atualmente em um dos patamares mais fortes dos últimos anos e sem sinal de reversão no curto prazo, rompendo ainda a paridade do euro. Com relação ao cenário econômico na China, o economista explicou que nas últimas semanas o país apresentou pequenos sinais de melhoria, mas ainda longe do esperado para uma retomada efetiva da economia chinesa. Entre os principais desafios enfrentados pelo país, os setores imobiliário e de serviços, são os que apresentam retomada mais lenta.

Já com relação ao Brasil, ele destacou a perspectiva de um avanço de 2,5% do PIB do país em 2022, além da expectativa de um crescimento desse indicador em torno de 0,5% em 2023. O economista acrescentou ainda que o país também foi atingido pela inflação, mas que ela tem recuado, com expectativa de queda mais expressiva apenas no segundo semestre do ano que vem. 
 

Para falar sobre as perspectivas de mercado, o evento contou com a análise de Fábio Lima, consultor em gestão de risco da StoneX. De acordo com o analista, os próximos meses serão de desafios para o produtor. Os preços estão elevados e a guerra entre Rússia e Ucrânia tem sido a justificativa utilizada pelo setor para esses repasses.

Ele afirma, no entanto, que as questões geopolíticas ainda trazem muita incerteza para o setor, já que existe uma grande concentração de produção do cereal no Mar Negro, mas outras variáveis importantes também devem resultar em desafios. A Sindustrigo destacou que o analista também trouxe a lembrança do “primeiro choque” para o setor, em 2020, quando a China dobrou as importações. 

E, em 2021, com a “quebra” do Hemisfério Norte, o setor se desestabilizou e, atualmente, a guerra também tem contribuído para essa conjuntura desafiante.

“Foram uma série de acontecimentos ao longo dos anos. Mas, sobre a guerra, devemos ter esse legado de reorganização geopolítica. Vamos levar, para o próximo ano, dúvidas sobre quais países poderemos fazer negócios. Não há como ficarmos fazendo os mesmos negócios como temos feito há 20 anos”, pontuou Lima no evento do setor.

Diante desse cenário, ele acredita que a guerra vai continuar afetando a cadeia de suprimentos de forma geral. Além desses pontos, acrescentou desafios com a oferta restrita, estoques mais baixos do que o normal, custo elevado de produção e que será alto não só no Brasil, mas nas principais origens produtoras. Caso aconteça uma garantia de exportação do Mar Negro, os preços podem voltar a cair, se a Rússia reduzir a taxa de exportação. 

Ele também acrescentou que a recessão pode afetar o consumo de bens duráveis, mas não no setor alimentício. 

Em números, para o Brasil, o consultor informou que a estimativa da StoneX, em relação à produção – safra 2022/23 – será de 10,6 milhões de toneladas do cereal.

Tendência 

De acordo com uma pesquisa realizada pela Euromonitor, o setor de trigo passa por um momento em que precisa entender as necessidades do consumidor, de acordo com dados de Karoline Dornella, química responsável pela área de Pesquisa & Desenvolvimento da Bakery da Prozyn Biosolutions. 

“A exigência é cada vez maior por produtos 100% naturais, sem conservantes e sem açúcar.  O consumidor quer manter o poder de escolha, com informação. As empresas precisam entender o porquê da escolha de uma marca e não de outra”, ressaltou Karoline. Para a pesquisadora, o setor precisa se atentar às melhorias e conhecimento sobre os ingredientes e processos, tendo como base uma comunicação transparente, o que favorece o desenvolvimento do mercado.

“A escolha do consumidor passa por saber se aquele produto é sustentável, inclusive do ponto de vista da embalagem, com informações mais objetivas, deixando clara a inclusão de aditivos, ou até mesmo a ausência destes, dentro do conceito ‘menos é mais’, muito valorizado atualmente”, afirmou Karoline.

A química trouxe ainda a abordagem de como trazer essa temática também para as farinhas de trigo. De acordo com a especialista, na linha lean label, por exemplo, baseamos em enzimas de maciez para frescor, livres de ADA e emulsificantes, para pães crocantes e macios, a adoção de farinha para pão caseiro, com o apelo da exclusão de aditivos. 

Já o painel “Panorama dos Mercados Consumidores” teve a presença do presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Biscoitos, Massas Alimentícias e Pães & Bolos Industrializados (Abimapi) e também do Sindicato das Indústrias de Biscoitos e Massas Alimentícias no Estado de São Paulo (Simabesp), Cláudio Zanão, do Diretor do Sindicato dos Industriais de Panificação e Confeitaria de São Paulo (Sampapão), Eduardo Gamboa, e do CEO da Food Consulting, Sério Molinari.

Os nomes referências para o setor apresentaram dados sobre consumo. Cláudio Zanão destacou os números atingidos pelo mercado de massas, pães e biscoitos, com R$ 50,4 milhões de valor por ano, o que representa importante volume em para toda cadeia, com volume de R$ 4,8 milhões de toneladas em vendas a cada ano. “Mas temos um grande desafio envolvendo a quebra de paradigmas para aumentar a frequência semanal de consumo de nossos produtos”, explicou.

Para o cenário pós-pandemia, Zanão destacou ainda a intensa movimentação no consumo dentro de casa e não a retomada fora do lar. Segundo ele, essa retomada é desafiada por uma menor frequência e volume por ocasião. 

Eduardo Gamboa falou sobre a contribuição dos moinhos para as padarias diante do cenário macroeconômico atual. De acordo com o analista, os moinhos atendem diversos públicos, nas mais variadas necessidades em vários momentos do dia. “Atualmente existem 87 mil padarias no Brasil e 22 mil em SP. No Brasil, elas faturam R$ 106 bilhões, sendo R$ 40 bi somente em SP”, destacou. “São 920 mil empregos diretos no Brasil e 330 mil em SP, com 1,6 milhão de empregos indiretos no país e 560 mil em SP”, ressaltou.

Para finalizar os debates, o encontro teve a participação de Sérgio Molinari, que destacou a trajetória de recuperação do foodservice, que movimentou aproximadamente R$ 177 bilhões em mercadorias no ano passado. 

“O Brasil é o 5º maior mercado do mundo e qualquer ganho de renda e aumento no poder aquisitivo impulsiona muito nosso mercado”, destacou. “É importante avaliar que saímos da pior década de Produto Interno Bruto per capita em 100 anos. Nunca existiram duas décadas seguidas em queda e essa é, com certeza, uma década de crescimento”, afirmou. 

Molinari mostrou ainda as previsões de crescimento de 5% no mercado de foodservice para o ano que vem, acima do previsto anteriormente. “O desafio para o segmento é fazer melhor do que os seus ‘pares’ para ganhar mercado, afinal, poucas empresas estão preparadas para este aumento”, disse.